segunda-feira, 27 de março de 2017

Mansplaining

Eu achava meio bosta a definição de mansplaining, achava que talvez fosse coisa de radfem, essa personificação que eu não queria para mim, mas eu estava achando errado, pois isso existe e eu percebo agora.

Numa aula de química, Nat por acabar de colocar lindas unhas com fibra de vidro, não conseguia abrir o ziploc, era cedo, perto das 10, um coleguinha da engenharia beirando lá seus 18 anos, com cara de recém parido da High School, na maior boa vontade do mundo se dispõem a ajudar, pergunta se Nat quer ajuda, ela diz que não precisa e segue tentando abrir. Após alguns segundos sem sucesso o mocinho prestativo decide ensinar minha amiga como se faz para abrir um ziploc, super didaticamente e agindo como se estivesse se dirigindo à uma criança de cinco anos, ele disserta um tutorial detalhado de como se abre um ziploc. Desnecessário, visto que ali todos estamos na universidade, Nat no caso, assim como eu termina a graduação esse ano, bem ao contrário do nosso colega explicativo e calouro. Cansada de assistir a situação ridícula, peguei o saco da mão da Nat e abri o ziploc em alguns segundos, agradecendo o amigo, mas dizendo que nós sabíamos sim abrir um ziploc. E também sabemos comparar estruturas homologas em animais, construir cladogramas do zero, além de fazer extração de DNA de plantas. Aliás o que é um ziploc perto de uma forquilha de replicação não é mesmo?

Numa aula prática de anatomia, descubro que o colega novo vindo da Unesp esta em meu grupo de estudo, acho bom, pois um cara vindo da Unesp certamente sabe bastante coisa. Após alguns minutos de aula ou nem isso, uma mariposa passa sobrevoando nossa mesa, Erika brincando diz que tem uma borboleta na sala, eu rio e fazendo uma brincadeira digo que é muito feio alguém no último ano de biologia não saber diferenciar uma mariposa de uma borboleta, partindo daquela ideia de senso comum que diz que biólogos devem saber absolutamente tudo sobre bichos e plantas. Rimos todos até que o amigo sabichão me interrompe visando explicar sobre como é difícil diferenciar mariposas de borboletas, pois não é assim tão fácil, pois não se pode saber sem observar de perto o exemplar. Sim o amigo tinha razão, mas acho que ele havia se esquecido que apesar de características isoladas de cada exemplar não serem decisivas para uma boa identificação, um conjunto de características pode sim auxiliar numa rápida identificação através da observação. No caso o serzinho voador era de coloração amarronzada ( presente tanto em mariposas como em borboletas, porém mais comum em mariposas) abdome inchado ( muito comum em mariposas) e fundamentalmente hábito noturno ( raro em borboletas e muito comum em mariposas) um pequeno conjunto de características que juntas podem me dar uma ideia de que o bichinho, voando, as 21 horas era na verdade uma mariposinha. Expliquei calmamente para o amigo sobre essa situação e ele concordou ainda meio contrariado. 

Um colega outro dia quis me explicar durante uma aula de diversidade o que era orientação sexual, partindo daquele pressuposto básico de que eu, talvez por ser mulher, não sabia. Ao dizer para ele que eu agradecia a explicação, mas eu já sabia o que era orientação sexual, ele querendo afirmar meu conhecimento me solta " então me explica para eu ver se você entendeu mesmo". Eu ri e agradeci novamente dizendo que aquilo era desnecessário pois eu realmente sabia o que era orientação sexual. Quis pagar de sabichão da diversidade comigo? Logo eu bissexual militante da causa LGBTTT?

domingo, 26 de março de 2017

Bolha

É possível te sentir vindo, mas ao mesmo tempo tento ao máximo evitar sua aproximação, não agora, não é este o momento para que todo esse sentimento retorne, as semanas passam e eu mal vejo tudo acontecer, basta vir um ócio, um único ócio de fim de semana e essa cabeça enche, os olhos ardem, as lágrimas chegam. Mas isso não pode chegar agora, esse momento é essencial, eu tenho me esforçado tanto, eu tenho realmente me esforçado, eu tenho sido uma sobre-eu, tenho agido como nunca acreditei que pudesse agir, tenho sentindo a maturidade chegando, tenho pesado as consequências e tenho notado os temores da vida adulta, das responsabilidades. É difícil aceitar que há sonhos impossíveis e ideais utópicos, é difícil aceitar que eu estarei disposta a abrir mão de muito mais coisas por propósitos que até ontem jamais fariam sentido, é difícil aceitar que sempre irá existir novas crises e novas tempestades, o mundo não é sereno, o ritmo é insano e não, nada irá parar junto comigo, nem hoje, nem amanhã e eu me arrasto, porém sempre devo continuar, e não minha criatividade, emotividade, sensibilidade, empatia nem sempre ajudam, ás vezes aparentam até mesmo atrapalhar. Atualmente tudo é frio e eu estou aqui na mais afastada câmara de gelo, eu ouço de minha orientadora sobre meu maravilhoso potencial para um mestrado, ouço que não devo fugir do currículo, ouço que devo seguir na botânica, ouço que talvez seja melhor fazer concurso, tentar IBAMA, tentar a vida longe, perto, aqui, ali, fazer uma pós, bacharelado, desistir da licenciatura, educação, oi? E a vida me chama para a fisiologia, toxicologia, etnobiologia, aparentemente eu tenho aptidão para tudo, aparentemente eu sou uma das melhores, aparentemente eu sou ótima, mas eu sei que sou apenas a pessoa mediana que procrastina uma leitura de artigos para ver vídeo bosta no youtube e ler Dostoiévski. Eu sou aquela que vai acumulando os sentimentos pois não consegue resolver questões existenciais e se dedicar a um projeto simultaneamente, no fundo eu sei que sou ótima mesmo em pintar imagens que não são reais de mim mesma, no fundo eu estou assutada e orgulhosa ao mesmo tempo, eu estou insegura e determinada, eu estou muito bem e muito confusa. E é possível te sentir vindo, sentir aquela fugaz sensação de que tudo faz sentido e em questão de segundos tal noção se esvair com um soprar de vento. Esta tudo se encaminhando e eu apenas sei que um turbilhão de coisas não podem me atingir agora, estou na bolha que eu criei para não me desviar do foco, a frágil e translúcida bolha.   

Eu vou conseguir!

domingo, 5 de março de 2017

Ir

Você vai!
Não importa como, não importa a forma com que vai chegar,
mas você vai!

Eu sempre coloco na minha cabeça "isso vai acontecer" não importa esse percurso louco, não importa essa vontade de desistir no meio do caminho, morrer na praia, não importa, isso vai acontecer.

Você vai!

Eu sempre penso que não vai dar, que uma força descomunal não vai me deixar sair da cama, nem hoje e nem amanhã. Mas eu vou! Eu coloquei na cabeça que isso vai acontecer e sim, isso vai acontecer!

Eu vou, eu digo, mesmo que eu queira ficar em casa, deitada, dormindo, assistindo intermitentemente temporadas intermináveis de séries, mesmo que doa cada pedacinho do meu corpo, eu só tenho que ir.

Deixo pra trás esse dor, esse medo e estou lá e quando estou, parece que eu apenas não deveria estar em nenhum outro lugar, apenas ali, trabalhando naquilo.

Pode parecer que estou me deixando para trás, mas há momentos que é necessário apenas ir e se forçar a ir e estar no agora, depois cuido disso, amanhã, amanhã eu levanto e cuido disso tudo que esta ficando para trás, desse relacionamento conturbado, da minha cabeça confusa e do meu medo do futuro, do tempo, do amor.

amanhã.

Os Gêneros

Nós, mulheres, resistimos sim! Agora te pergunto, você trabalha com educação ? Já teve algum(a) aluno(a) que não se reconhecia no próprio gênero? Já conviveu/conversou com pessoas trans? Sabe qual é o real sentimento dessas pessoas em relação ao órgão sexual com o qual nasceram? Se por algum motivo você não teve a oportunidade de alguma dessas vivências, vou te contar duas coisas, a primeira, mulheres ditas trans negam o próprio falo, sim, elas negam! Geralmente durante a excitação sexual elas se constrangem, sério mesmo, elas odeiam aquele pedaço do corpo, muitas querem realmente se ver livre daquilo e a maioria delas, quando se relacionam com alguém, seja essa pessoa mulher ou homem geralmente não costumam coagir ninguém a lidar com o falo, pelo simples fato de não se sentirem bem com o órgão sexual.

Muitas dessas pessoas se privam de relacionamentos íntimos justamente por não se sentirem a vontade com o corpo biológico. Segunda coisa, eu tive sorte de entrar na federal no ano de 2012, se eu não tivesse entrado aos 18 anos no meio acadêmico certamente não teria tido contato com o movimento feminista. Agora, interessante lembrar que o meio acadêmico é elitista, eu cheguei a federal de Pelotas aos 18 porque tive a oportunidade de estudar em uma escola paga durante parte da minha vida, hoje estou me formando, novamente, porque tive e tenho a oportunidade de ter uma mãe que pode me bancar enquanto eu me dedico totalmente ao meu curso e minha profissão. Bom, minha mãe não teve essa oportunidade, assim como a minha prima não teve também, minha mãe conheceu o feminismo por mim e minha prima por algumas amigas que também tiveram a oportunidade que ela não teve, essa de estar na universidade.

No dia em que o programa foi ar, minha mãe me ligou falando que nosso movimento estava sendo citado na TV aberta, super empolgada. Minha mãe tem 54 anos e só hoje compreende as repressões que viveu. Já minha prima tem 23, me mandou mensagem no whatsapp dizendo que tinha uma galera falando de liberdade sexual da mulher na TV. Eu não assisto TV, mas fui buscar ver o programa citado e bom, achei diversas abordagens péssimas, assim como acho péssimo muita coisa dentro do movimento ao qual participo, mas ainda sim achei válido, porque sim, eu como mulher quero um movimento que abranja todas e não que segregue ainda mais, o movimento não é democrático e não chega à todas, quanto mais vinculado for, melhor! Claro há melhores abordagens, mas ver sua aluna de 16 falando sobre liberdade sexual da mulher, sobre respeito e sobre assédio é maravilhoso, ouvir sua mãe dizer super empolgada "nosso movimento esta na TV aberta" é emocionante. Sei que nem te conheço direito, mas sabe experimentei essa discussão com minhas alunas de segundo ano de uma escola estadual e foi ótimo, tínhamos uma trans na discussão, foi lindo e enriquecedor, eu recomendo!